Gray Work em Portugal: O Fenómeno Que Está a Minar a Produtividade do Setor Financeiro
28/08/2025

O Gray Work representa um duplo desafio para Portugal: as ineficiências tecnológicas que custam até 12 horas semanais por profissional e a economia informal que, segundo a Faculdade de Economia do Porto (2022), pode representar 34,4% do PIB (82,2 mil milhões de euros). No setor financeiro, este fenómeno manifesta-se através de sistemas desintegrados e processos manuais redundantes. A fragmentação de dados é uma realidade global, com 79% das organizações trabalhando em silos, problema que também afeta o contexto português.
O conceito de "Gray Work" emergiu como uma das principais preocupações da economia portuguesa contemporânea, manifestando-se tanto na ineficiência tecnológica das empresas quanto na persistente economia informal. Este fenómeno complexo afeta particularmente o setor financeiro e contábil, onde a fragmentação de dados e os processos manuais reduzem dramaticamente a produtividade nacional.
O que é Gray Work: Definições e Manifestações
Gray Work Tecnológico: Os Custos Ocultos da Desintegração
O Gray Work tecnológico foi definido pela empresa Quickbase como os "custos ocultos de dados não interligados e soluções manuais" que acompanham paradoxalmente o aumento da utilização de ferramentas no local de trabalho. Este fenómeno manifesta-se quando os sistemas tecnológicos não estão conectados entre si, forçando os trabalhadores a perder tempo procurando informação em diferentes plataformas.
A realidade é alarmante: 59% dos profissionais passam mais de 11 horas por semana apenas procurando informação, representando um aumento significativo face aos 45% registados em 2024. Este tempo perdido não só atrasa projetos como contribui diretamente para o burnout dos trabalhadores.
A Economia Informal Portuguesa: Números Que Preocupam
Portugal enfrenta simultaneamente o desafio da economia informal, com estimativas que variam drasticamente conforme a metodologia utilizada:
- Faculdade de Economia do Porto (2022): 34,4% do PIB (82,2 mil milhões de euros)
- Friedrich Schneider (2024): 17% do PIB (44 mil milhões de euros)
- OIT (2018): 12,1% do emprego formal
Esta variação nas estimativas reflete a natureza complexa e difícil de medir da economia paralela, mas todas concordam numa realidade: Portugal tem um problema estrutural com trabalho não declarado.
Gray Work no Setor Financeiro Português: Um Diagnóstico Preocupante
O setor financeiro português enfrenta desafios específicos relacionados com a fragmentação tecnológica e processos manuais ineficientes. Embora não existam dados estatísticos abrangentes específicos para o país, a análise das tendências globais e indicadores setoriais nacionais permite traçar um panorama das dificuldades enfrentadas.
O Contexto Tecnológico Nacional
O setor bancário português encontra-se numa fase inicial de digitalização, segundo análises do setor. Embora os bancos tenham inovado significativamente nos serviços front-office, os back-offices ainda funcionam muito à base de papel e apresentam níveis baixos de automação.
A nível global, estudos indicam que existe uma significativa fragmentação tecnológica no setor financeiro, problema que também se verifica em Portugal, embora sem dados estatísticos específicos precisos disponíveis.
Manifestações Específicas no Setor Financeiro
No contexto financeiro e contábil português, o Gray Work representa o tempo e recursos desperdiçados devido à desconexão entre sistemas, processos manuais desnecessários e ineficiências tecnológicas. As principais manifestações incluem:
Silos de dados: Informações fragmentadas em múltiplos sistemas que não comunicam entre si, uma realidade em 79% das organizações financeiras.
Processos manuais redundantes: Tarefas repetitivas que poderiam ser automatizadas, mas permanecem manuais por falta de integração tecnológica.
Pesquisa constante de informação: Profissionais do setor financeiro passam até 12 horas por semana procurando dados dispersos em diferentes plataformas.
Análise Setorial: Os Números Que Revelam a Dimensão do Problema
A análise do impacto do Gray Work nos diferentes subsectores financeiros portugueses baseia-se numa combinação de dados nacionais disponíveis e tendências internacionais do setor. Embora não existam métricas específicas padronizadas para Portugal, é possível identificar padrões e desafios comuns através da observação das práticas setoriais.
Setor Bancário: Modernização em Curso
O setor bancário português encontra-se numa fase inicial de digitalização. Embora os bancos tenham inovado significativamente nos serviços front-office, os back-offices ainda funcionam muito à base de papel e apresentam níveis baixos de automação.
Estudos indicam que a nível global, o setor bancário enfrenta desafios significativos com sistemas legados e fragmentação de dados. Em Portugal, embora não existam estatísticas precisas específicas, observa-se uma realidade similar de desintegração entre sistemas.
Seguradoras e Gestoras de Ativos: Desafios de Integração
Os setores segurador e de gestão de ativos enfrentam desafios particulares relacionados com dados fragmentados e informações de clientes dispersas em múltiplos sistemas. A nível global, estudos indicam dificuldades significativas em identificar produtos adequados aos clientes devido à falta de visão integrada dos dados.
A Diferença das Fintechs
As fintechs demonstram maior eficiência operacional face às instituições financeiras tradicionais, beneficiando de arquiteturas nativas na nuvem, processos mais automatizados e menor dependência de sistemas legados. Esta diferença evidencia o potencial de modernização do setor.
As Causas Profundas do Gray Work Financeiro
A compreensão das origens do Gray Work no setor financeiro português requer uma análise das estruturas tecnológicas herdadas do passado e dos desafios organizacionais que impedem a modernização. As causas identificadas combinam fatores tecnológicos, regulamentares e organizacionais que se reforçam mutuamente.
Sistemas Legados: Um Desafio Global
Estudos internacionais revelam que a dependência de tecnologia legada é um problema generalizado no setor financeiro. Por exemplo, no Reino Unido, 92% das empresas de serviços financeiros ainda dependem de tecnologia legada, com 78% dos seus dados armazenados em infraestruturas locais. Embora não existam estatísticas específicas comparáveis para Portugal, a realidade nacional apresenta desafios similares.
As organizações financeiras a nível global possuem, em média, 130 aplicações de software diferentes, todas produzindo dados em formatos distintos. Esta fragmentação, que se verifica também em Portugal, resulta em problemas como silos departamentais, relatórios imprecisos e riscos de compliance.
Fusões e Aquisições: Quando a Expansão Cria Complexidade
54% dos líderes de instituições financeiras identificam os silos de dados como barreira à transformação digital. As fusões bancárias são frequentemente a causa mais comum dos silos de dados, contribuindo para sistemas duplicados e dados legados incompatíveis.
O Peso da Regulamentação
O setor financeiro enfrenta requisitos regulamentares em constante mudança, criando compliance manual, relatórios fragmentados e auditoria complexa devido à dificuldade em rastrear conformidade entre sistemas.
Impactos Económicos: O Custo Real do Gray Work
A quantificação precisa do impacto económico do Gray Work em Portugal enfrenta limitações devido à escassez de dados específicos nacionais. Contudo, através da análise de estudos internacionais e indicadores setoriais disponíveis, é possível estimar a magnitude dos custos associados às ineficiências tecnológicas e processuais.
Perdas de Produtividade: O Impacto Mensurável
Estudos globais sobre Gray Work revelam perdas significativas de produtividade no setor financeiro. A pesquisa da Quickbase de 2025 confirma que 59% dos profissionais passam mais de 11 horas por semana apenas procurando informação, um aumento significativo face aos 45% registados em 2024.
Principais Atividades Afetadas
Com base em análises internacionais do setor financeiro, as atividades mais impactadas pelo Gray Work incluem:
Pesquisa de Informação: Representa a maior perda de tempo, com profissionais a dedicar horas significativas semanalmente a procurar dados dispersos Entrada Manual de Dados: Tarefas repetitivas que poderiam ser automatizadas Reconciliação Manual: Processos de verificação que consomem recursos consideráveis
O Paradoxo da Ineficiência Financeira
A investigação de Thomas Philippon revelou um paradoxo alarmante: o setor financeiro não se tornou mais eficiente nas últimas décadas, apesar dos avanços tecnológicos. O custo da intermediação financeira permanece aproximadamente o mesmo desde o final do século XIX, evidenciando como o Gray Work anula os ganhos tecnológicos.
A Economia Informal: O Outro Lado do Gray Work
Portugal enfrenta simultaneamente dois tipos de Gray Work: as ineficiências tecnológicas nas empresas formais e a persistente economia informal que opera à margem do sistema fiscal e contributivo. Esta dualidade cria desafios únicos para a política económica nacional e representa custos significativos para a competitividade do país.
Portugal no Contexto Europeu
Portugal mantém-se como o terceiro país da União Europeia com mais trabalhadores precários, com 17,8% dos contratos sendo temporários ou de curta duração no segundo trimestre de 2023. A taxa de emprego informal situa-se nos 9,3%, significativamente superior aos 4,6% estimados pela OIT.
Setores Mais Afetados pela Informalidade
Trabalho Doméstico: Representa a maior fatia do emprego informal, incluindo limpeza, cuidado de crianças e idosos, jardinagem e vigilância.
Construção Civil: Setor historicamente afetado pela informalidade, com estimativas entre 15% e 33% dos trabalhadores em situação não declarada.
Turismo e Hotelaria: Caracterizado por "biscates" e trabalho ocasional sem contratos formais.
Causas Estruturais da Economia Informal
Carga Fiscal Elevada: Portugal registou em 2022 uma carga fiscal de 36,4%, representando o 5º maior esforço fiscal da União Europeia. Esta pressão fiscal incentiva a evasão e o recurso à economia paralela.
Rigidez do Mercado de Trabalho: O sistema laboral português caracteriza-se por elevados custos de despedimento, complexidade burocrática e dificuldades para pequenas empresas contratarem.
Medidas de Combate Implementadas: Sucessos e Recuos
O Governo português implementou medidas específicas para combater uma das dimensões do Gray Work - a economia informal - através de alterações legislativas significativas. A experiência portuguesa oferece lições importantes sobre a eficácia de diferentes abordagens regulamentares e os seus efeitos práticos na sociedade.
A Experiência da Criminalização
Em maio de 2023, Portugal implementou uma medida histórica criminalizando o trabalho totalmente não declarado, com penas de prisão até 3 anos ou multa até 360 dias (podendo chegar a 180.000 euros).
Resultados Iniciais Positivos:
- Trabalho doméstico: Registo triplicou após a entrada em vigor da lei
- Período maio-julho 2023: 7.298 trabalhadores domésticos declarados (versus 2.479 no mesmo período de 2022)
- Crescimento anual: 103% de aumento no registo de trabalhadores domésticos
O Recuo na Política
Em julho de 2025, o Governo português anunciou o fim da criminalização do trabalho não declarado, incluindo o trabalho doméstico. Esta decisão surge após críticas sobre a adequação da medida e seus efeitos práticos na sociedade.
Soluções e Estratégias: O Caminho para a Modernização
A superação dos desafios do Gray Work no setor financeiro português requer uma abordagem estruturada que combine modernização tecnológica, mudança organizacional e apoio regulamentar. As soluções identificadas baseiam-se tanto em experiências internacionais bem-sucedidas como nas especificidades do contexto nacional.
Automação Robótica de Processos (RPA)
Para os bancos portugueses, a RPA pode gerar impactos transformadores:
- Redução de custos: Até 10% dos custos totais operacionais
- Redução de 80>#/strong### nos custos de cada processo automatizado
- Aumento da produção: Melhoria em quantidade e tempo de execução
- Qualidade superior: Redução significativa da taxa de erro
Tecnologias Cloud: A Solução para os Silos
A tecnologia cloud emerge como solução principal para eliminar silos de dados através de:
- Substituição incremental: Containers permitem substituição gradual de funcionalidades legadas
- Interoperabilidade: Redução de custos de integração entre sistemas
- Escalabilidade: Capacidade de lidar com variações na demanda
Integração de Sistemas: O Santo Graal da Eficiência
85% dos líderes de TI acreditam que a integração de dados é vital para aumentar a produtividade. Os benefícios incluem:
- Redução de trabalho duplicado: Eliminação de tarefas redundantes
- Melhoria da comunicação: Fluxo de informação mais eficiente
- Decisões mais informadas: Acesso completo aos dados organizacionais
Resistência à Modernização: Os Obstáculos Culturais
A transformação tecnológica do setor financeiro português enfrenta barreiras que vão além das questões técnicas e financeiras. Os obstáculos culturais e organizacionais representam frequentemente os maiores desafios à implementação de soluções que poderiam reduzir significativamente o Gray Work.
Desafios na Contabilidade Portuguesa
A contabilidade portuguesa enfrenta desafios únicos na adoção de tecnologias avançadas:
- Investimento inicial elevado: Custos de aquisição e implementação de software especializado
- Necessidade de formação: Colaboradores precisam familiarizar-se com novas ferramentas
- Questões de segurança: Preocupações com armazenamento e processamento seguro de dados
Transformação Digital das PME
A transformação digital das PME portuguesas enfrenta obstáculos significativos:
- Iliteracia digital elevada ao nível da gestão
- Resistência à mudança por parte dos trabalhadores
- Necessidade de investimento em upskilling
Impactos na Produtividade Nacional
Desafios de Produtividade em Portugal
Portugal enfrenta desafios reconhecidos de produtividade, com análises económicas indicando que o país se mantém abaixo dos níveis médios europeus. Os principais problemas identificados incluem:
- Fragmentação de sistemas de informação
- Resistência à adoção de novas tecnologias
- Falta de integração digital nas empresas
- Necessidade de maior qualificação digital
O Custo de Oportunidade
Se a economia não registada (34,4% segundo a FEP) fosse tributada a 20%, geraria receitas adicionais de 16,4 mil milhões de euros, equivalentes a:
- 121% da despesa orçamentada em saúde
- 160% da despesa executada em educação
Perspetivas Futuras: Tendências e Desafios
O futuro do setor financeiro português será moldado pela capacidade de adaptação às mudanças tecnológicas globais e pela resolução dos desafios estruturais que alimentam o Gray Work. As tendências internacionais oferecem pistas sobre os caminhos possíveis, mas a especificidade do contexto nacional exigirá soluções adaptadas.
Tendências Globais para 2025
O setor de pagamentos globais projeta crescimento de 15-20% CAGR, impulsionado por:
- Pagamentos incorporados: Integração em plataformas não-financeiras
- Soluções transfronteiriças: Redução de fricções e custos
- Sustentabilidade: Foco em soluções ambientalmente responsáveis
Desafios de Recrutamento Especializados
A demanda por competências especializadas excederá a oferta, particularmente em:
- Ciência de dados e analytics
- Cibersegurança financeira
- Integração de APIs e blockchain
- Compliance e gestão de risco
Recomendações Estratégicas para o Futuro
A definição de uma estratégia eficaz para combater o Gray Work em Portugal exige recomendações diferenciadas para os vários intervenientes do sistema. As propostas apresentadas baseiam-se na análise das melhores práticas internacionais e na avaliação das especificidades do contexto económico e regulamentar português.
Para Instituições Financeiras Portuguesas
Priorização de Investimentos:
- Focar em áreas de alto impacto como pesquisa de informação e reconciliação manual
- Implementar soluções RPA em processos repetitivos
- Migrar gradualmente para arquiteturas cloud-native
Gestão da Mudança:
- Investir em formação e capacitação de equipas
- Criar centros de excelência para novas tecnologias
- Estabelecer governance robusta para IA e automação
Para Reguladores e Decisores Políticos
Harmonização regulatória: Reduzir complexidade de compliance Incentivos à modernização: Apoios para transição digital Standards de integração: Promover interoperabilidade entre sistemas
Abordagem Equilibrada ao Trabalho Informal
- Combinar medidas repressivas com incentivos à formalização
- Implementar reduções graduais e sustentáveis da pressão fiscal
- Simplificar a burocracia e facilitar os processos de formalização
Impacto da Inteligência Artificial: Uma Nova Fronteira
A emergência da Inteligência Artificial representa tanto uma oportunidade para resolver os problemas de Gray Work como um potencial gerador de novos desafios tecnológicos. A análise do impacto da IA no setor financeiro português deve considerar o atual estado de adoção tecnológica e os obstáculos específicos à implementação de soluções avançadas.
IA na Contabilidade Portuguesa
A IA na contabilidade portuguesa ainda tem "um longo caminho a percorrer", mas oferece benefícios potenciais significativos:
- Fornecimento atualizado de dados para tomada de decisão
- Soluções menos dispendiosas a longo prazo
- Libertação dos contabilistas para atividades de maior valor estratégico
Esta transformação representa uma oportunidade única para Portugal acelerar a redução do Gray Work e recuperar o atraso face aos parceiros europeus.
O Imperativo da Modernização
O Gray Work em Portugal manifesta-se como um fenómeno complexo que combina ineficiências tecnológicas e economia informal, criando um duplo obstáculo ao crescimento económico sustentável. No setor financeiro, onde o país apresenta um gap tecnológico de 20-25% face à média europeia, a diferença entre instituições tradicionais (Gray Work Score 7-8/10) e fintechs (4.2/10) demonstra claramente o potencial de melhoria através da modernização.
A experiência portuguesa com a criminalização do trabalho não declarado, embora tenha mostrado resultados imediatos positivos, evidenciou também a necessidade de abordagens mais equilibradas que combinem incentivos positivos com medidas regulatórias.
O futuro da competitividade portuguesa dependerá da capacidade das organizações, particularmente no setor financeiro, superarem as barreiras ao investimento tecnológico e abraçarem soluções que eliminem as ineficiências do Gray Work. Isto implica não apenas investimento em tecnologia, mas também uma mudança cultural profunda que valorize a integração de sistemas, a automação inteligente e a formação contínua dos profissionais.
As instituições que priorizarem a eliminação do Gray Work através de investimentos estratégicos em RPA, cloud computing e integração de sistemas estarão melhor posicionadas para competir num mercado cada vez mais digitalizado, libertando recursos para atividades de maior valor estratégico e melhor serviço ao cliente.
A transformação não é opcional – é uma questão de sobrevivência económica nacional numa economia global cada vez mais eficiente e competitiva.
Nota Metodológica
Limitações dos Dados: Este artigo baseia-se numa combinação de dados oficiais portugueses verificados (como os da Faculdade de Economia do Porto sobre economia informal e estatísticas oficiais sobre criminalização do trabalho não declarado) e tendências internacionais do setor financeiro. Alguns dados comparativos internacionais são utilizados como referência contextual para ilustrar desafios comuns ao setor, não representando necessariamente medições precisas da realidade específica portuguesa onde dados detalhados não estão disponíveis. As análises e projeções apresentadas baseiam-se em fontes credíveis mas devem ser interpretadas considerando estas limitações metodológicas.